Mulher que só mexe olhos e queixo defende doutorado na USP
Ana Amália Tavares Barbosa, 46 anos, perdeu os movimentos há dez anos e defende tese de doutorado.
A matéria abaixo foi extraída do jornal Folha de S. Paulo.
Por Claudia Collucci
Ela não fala, não come, não se move. Mas pinta, estuda e ensina arte a crianças que nasceram com paralisia cerebral. Tudo isso usando o olhar, um leve movimento de queixo e um programa de computador desenvolvido especialmente para ela.
Nesta quarta, às 14h, a artista plástica Ana Amália Tavares Barbosa, 46, defende sua tese de doutorado em arte e educação no Museu de Arte Contemporânea da USP, iniciada quando já estava paralisada.
O estudo, intitulado “Além do Corpo”, é fruto de três anos de trabalho com artes visuais desenvolvido com um grupo de seis crianças com lesões cerebrais, atendidas na Associação Nosso Sonho, onde Ana também leciona.
Todas as crianças usam cadeiras de rodas, não falam e têm dificuldade de enxergar. Assim como a professora.
Falar com os olhos: A síndrome do Encarceramento
Filme: O Escafandro e a Borboleta
Britânica relata luta contra síndrome de encarceramento após derrame
Em 2 de julho de 2002, exatamente no dia da defesa da sua dissertação de mestrado na ECA (Escola de Comunicações e Artes), Ana Amália sofreu um AVC (Acidente Vascular Cerebral) no tronco cerebral e ficou tetraplégica, muda e disfágica (não consegue mastigar e engolir).
“Ela começou a passar mal quando uma das pessoas da banca não apareceu porque confundiu as datas. No hospital, foi perdendo os movimentos, começando pelas pernas”, conta a mãe Ana Mae Barbosa, 75, professora aposentada da Faculdade de Educação da USP.
O pai, João Alexandre Costa Barbosa (morto em 2006), crítico literário e também professor aposentado da USP, acompanhava a filha.
Ele relatou à mulher as últimas palavras de Ana Amália. Ao escutar o médico perguntando se ela era muito nervosa, disparou: “Por que vocês médicos sempre acham que a culpa é do paciente?”.
Como sequela, Ana Amália ficou com síndrome do encarceramento (“locked in”), retratada no filme “O Escafandro e a Borboleta” (2007).
“No primeiro ano, ela só dizia: ‘eu quero morrer’. Depois, voltou a se apossar da vida”, diz a mãe.
Foram 40 dias de UTI e quatro meses de internação até Ana Amália voltar para casa. A família conta com três enfermeiras, que se revezam 24 horas, duas fonoaudiólogas e duas fisioterapeutas.
Com a cognição e a memória preservadas, Ana se comunica por meio de um cartão com letras e de um programa de computador, desenvolvido pelas redes Sarah (Brasília) e Lucy Montoro (SP).
O atual desafio é fazer com que ela mastigue e engula a comida. Ana usa um cateter ligado ao estômago.
Ana Mae consulta a filha o tempo todo. “Quantos semestres você cursou psicologia na PUC como ouvinte? Dois, três, quatro.” Ao ouvir quatro, Ana pisca os olhos. “Ela é a minha memória.”
A terceira Ana da casa, Ana Lia, 11, tinha apenas um ano e oito meses quando a mãe sofreu o AVC. “Aos poucos, ela aprendeu a interpretar meus olhares”, escreve, com os olhos, Ana Amália.
Os desenhos também foram (e continuam sendo) uma conexão entre as duas.
DOUTORADO
No projeto de doutorado, Ana Amália trabalhou, com a ajuda de assistentes, a percepção corporal dos alunos.
Uma das atividades foi desenhar o contorno dos corpos em papel, depois recortá-los e pintá-los. Por fim, construir cenas nas quais os corpos brincam. “Eles exploram o espaço já que não podem fazê-lo na vida real, pois estão presos à cadeira de roda.”
Outra preocupação foi a inclusão cultural dos alunos. Ana Amália os levou a espaços como o Instituto Tomie Ohtake e o Jardim de Esculturas (Parque da Luz).
Pergunto qual é sua principal dificuldade. “Conviver com a invisibilidade.”
Fontes: Folha de S. Paulo; G1
Vera, obrigado por compartilhar.
Em 1975 ganhei bolsa de estudos para a USP como cadeirante. Fui estudante de Linguistica da Universidade de Washington em Seattle. Ddurante o festival de Arte de Inverno morava e estudava um mês em Ouro Preto. (Sim, aquela cidade feito em cima e entre os morros com ruas impossiveis.) Ao chegar em São Paulo na USP encontrei tantas barreiras arquitetonicas e atitudinais que tive que desistir. Voltei para os Estados Unidos. Parabéns para TODOS que tem contribuido a este desenvolvimento cultural no Brasil no entretempo.
E parabéns doutora Ana Amália!!
Dr. Scott Rains
Agradeço seu depoimento, Scott. Nessa época, imagino a dificuldade que passou quando morava em Ouro Preto e estudava na USP.
Atualmente estamos avançando em relação às barreiras arquitetônicas, entretanto o nosso grande problema é a acessibilidade atitudinal. Nossa sociedade ainda é muito preconceituosa, ainda temos um longo caminho pela frente.
Realmente a dra. Ana Amália é digna de todas honrarias.
Abraços,
É. E nós que somos “perfeitos”, às vezes relutamos em realizar certas coisas julgando que não podemos. . . . . .
Queria deixar registrado minha grande admiração por esse ser humano tão maravilhoso que não se entregou nos obstáculos da vida e somente com o piscar de seus olhos nos ensinou muito sobre superação e coragem.Parabéns.
Que maravilha. Muito bonito de ver e de ouvir. Mas que maravilha. É este tipo de notícia que eu gosto muito de ler. Parabéns, parabéns, parabéns para ela.
Beijo, Vera.
Nelson
Isto é uma história de vida que cada um devia se orgulhar, pois muita gente reclama de tudo e não faz nada para mudar nossa rotina de vida, PARABÉNS pelo exemplo de vida que você nos dá e ser nosso orgulho de lutar pelo nossos ideais.
TUDO PARA UM MUNDO MELHOR……. ela está fazendo a parte dela e nós????
Prezada Vera,
Eu tenho uma admiração muito grande e reverencio pessoas como você todo dia pela superação e determinação e amor pela vida , mesmo quando algo acontece e limita parcialmente nosso físico. Eu sou hoje uma pessoa bem melhor devido a profissão que escolhi, pois aprendi muito com ela, sou fisioterapeuta e me especializei na área de neurologia para reabilitar fisicamente pessoas que veem a mim. Muitas felicidades, e muito sucesso é o que desejo pra você.
Geovânia
Obrigada, Geovânia! Desejo o mesmo a você!
Meu nome é Sillvilene, sou professora e museóloga.Moro no Rio de Janeiro. Estou escrevendo uma dissertação de Mestrado sobre inclusão em Museus de Ciências. Resolvi escrever sobre o assunto depois de receber em minha sala de aula dois alunos com paralisia cerebral, cadeirantes, com 6 anos de idade. Foi a melhor experiência que aconteceu na minha vida profissional. Gostaria de ter acesso a tese de Ana Amália, mas não encontrei no Banco de Teses da USP. Como posso fazer para entrar em contato com ela?