Cientistas da UFRJ testam com sucesso células-tronco de embrião em animais
Pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas da UFRJ alcançaram um avanço na busca por um tratamento para paralisia causada por danos na medula espinhal ao recuperar o movimento de animais paraplégicos com implantes produzidos a partir de células-tronco embrionárias.
O estudo confirmou que células tiradas de embriões são um caminho promissor para tratar lesões hoje incuráveis. O trabalho, todavia, ainda é totalmente experimental.
Aceita para publicação na revista científica “Brain Research”, a pesquisa mostrou que semanas após receberem uma injeção de células, os roedores recuperaram boa parte da capacidade de locomoção. Apenas cinco países já analisaram o efeito de células-tronco embrionárias na recuperação de paraplegia em animais. A meta dos cientistas agora é ampliar o estudo para macacos, mais próximos do homem.
Custos e problemas éticos considerados
O tratamento dos camundongos foi realizado no Laboratório de Neurodegeneração e Reparo da UFRJ, que estuda terapias celulares para lesões de medula. O grupo, liderado por Ana Martinez, recebeu células tronco embrionárias do Laboratório Nacional de Células-Tronco Embrionárias (LaNCE), também vinculado à universidade.
– Queremos saber que tipo de célula-tronco terá melhor relação de custo e benefício em um tratamento – antecipa a neurocientista. – Nosso objetivo é descobrir quais são as mais fáceis de adquirir, que não envolvam tantos problemas éticos em sua adoção e provoquem menor rejeição do organismo. As embrionárias foram as primeiras a passar por nosso teste.
As células-tronco embrionárias são conhecidas por sua capacidade de originar todos os tecidos do corpo humano.
Na experiência, os pesquisadores da UFRJ injetaram células nervosas que haviam sido desenvolvidas a partir das extraídas de embriões.
– O modo como diferenciamos as células foi suficiente para evitar a formação de tumores e permitir melhores resultados – explica Stevens Rehen, coordenador do LaNCE no Rio. – Poderíamos dar outras pistas a elas, especificando-as ainda mais. No entanto, queríamos vê-las assumindo o papel que julgassem mais interessante para o local comprometido. Trabalhamos com células embrionárias com a expectativa de não só recuperar o local da lesão, como, também, de fazer uma reposição celular.
Dez minutos após os cientistas provocarem a lesão – planejada para se assemelhar o máximo possível à paraplegia humana provocada por acidente -, os camundongos receberam a injeção das células-tronco.
Os dois meses seguintes foram de observação. Os roedores eram filmados enquanto andavam por uma área cercada de 90 centímetros de diâmetros, e sua velocidade foi comparada à de camundongos saudáveis e à de outros que tiveram a mesma lesão, mas não receberam células-tronco.
A qualidade do movimento também foi avaliada. Em uma escala de 1 a 9 – sendo 9 uma mobilidade comum, obtida antes da lesão -, os roedores que passaram por transplante de células-tronco registraram índice 3,8. É quase o dobro daqueles que não passaram por qualquer tratamento (2,0).
– Foi uma diferença significativa – comemora Ana. – O transplante melhorou a função motora dos animais. Aqueles que não receberam células-tronco também registraram uma pequena melhora, devido à reação do próprio organismo ao edema. É algo também visto nos seres humanos, embora com intensidade muito menor.
Impulsos nervosos são fortalecidos
Além de duplicar a resposta natural do corpo, as células-tronco embrionárias reforçaram as bainhas de mielina. Estas estruturas envolvem as células da medula espinhal e seus prolongamentos, favorecendo a transmissão de impulsos nervosos – ou seja, o transporte daquilo que é comandado do cérebro para o músculo.
Embora aconteçam anualmente milhares de lesões de medula espinhal em todo o mundo, o processo que impede o corpo de se regenerar e evitar a paralisia é pouco conhecido.
Mesmo com o sucesso de seu estudo, Rehen pondera que ainda será necessário obter uma série de avanços antes de aplicar, em seres humanos, o tratamento experimentado em laboratório.
– Um dos grandes problemas para qualquer transplante celular é a dificuldade das células em se integrar no tecido. Temos de aumentar sua taxa de sobrevivência, que hoje é de apenas 20% – ressalta o pesquisador.
O trabalho dos grupos de Ana e Rehen foi o primeiro no país a aplicar células-tronco embrionárias em medula espinhal e conseguir resultados positivos. No mundo, já são 41 estudos, mas o tema ainda é recente.
Fonte: O Globo (29/06/2010)