Acessibilidade na web: 7 mitos e um equívoco – Parte 1
Os mitos na acessibilidade web
No meu trabalho com acessibilidade web, tenho me deparado com mitos que, por não terem suas verdades decifradas, são reproduzidos e compreendidos no seu sentido literal, o que tem prejudicado bastante o nosso progresso.
Eles não aparecem como narrativas de estórias, mas como afirmações pseudocientíficas, que confundem a mente daqueles que ainda não adquiriram um profundo conhecimento do assunto.
Após sete anos de convivência com esses mitos, creio que chegou a hora de sistematizá-los e compartilhá-los com todos aqueles que se interessam pelo tema.
Cada mito apresentado será, primeiramente, confrontado com a realidade objetiva, que é, como veremos, muito diferente do que o mito afirma.
Em seguida, tentarei explicitar o que entendo ser a verdade oculta encerrada no mito.
Neste caso, como a verdade é sempre um temor, será chamada de “temor oculto”.
Finalmente, tentarei oferecer uma resposta a esse temor, que será chamada de “esclarecimento”.
O que é um mito?
Os mitos são narrativas (este é o sentido da palavra original grega), que são reproduzidas (imitadas) até se tornarem coletivas.
Aristóteles, em sua Poética, nos diz que “O imitar é congênito no homem… e os homens se comprazem no imitado.”
Os mitos não se baseiam na experiência empírica nem científica, baseiam-se na intuição.
E aí está a sua força, pois a intuição encerra sempre uma verdade.
Porém a verdade do mito não está aparente, precisa ser decifrada.
Quando, por exemplo, digo que determinada mulher é uma Atena, não quero dizer (como no mito da deusa) que ela não foi gerada no ventre de sua mãe, mas dentro da cabeça de seu pai, de onde saiu prontinha, com armadura e tudo!
Estou querendo dizer que ela é uma mulher guerreira, racional e bastante identificada com o modo de pensar masculino.
A verdade de um mito, portanto, não é literal, é simbólica.
É por este motivo que muitos o confundem com mentira, ilusão, lenda e fantasia.
Eles são exatamente isto, se forem considerados no seu sentido literal.
Os mitos na atualidade
Uma característica dos mitos modernos é que, ao contrário dos mitos gregos ou indígenas, eles não se referem à totalidade da existência humana, mas a temas específicos, como a sensualidade, a juventude, o corpo saudável, o poder etc.
E, como sua base inconsciente não está na razão e sim na emoção, eles são largamente utilizados na propaganda e na política.
Mito I – “Acessibilidade Web é só para deficientes visuais.”
Realidade: Pessoas cegas ou com baixa visão são terrivelmente prejudicadas pela falta de acessibilidade, pois, na maioria das vezes, elas não têm outra forma de obter a informação, a não ser através da internet. Mas não são elas as únicas que necessitam de acessibilidade.
Acessibilidade web é para…
* … Quem tem dificuldade para
- ver a tela;
- usar o mouse;
- usar o teclado;
- ler um texto;
- ouvir um som;
- navegar na internet;
* … Quem usa um navegador diferente;
* … Quem usa um equipamento muito antigo;
* … Quem usa um equipamento muito moderno;
* … Quem tem uma linha de transmissão muito lenta;
* … Quem está num ambiente ou situação que limita alguns dos seus sentidos ou movimentos, ou que requer a sua atenção.
Enfim, acessibilidade web é para todos!
Temor oculto: “Imagina o trabalhão que vai dar, fazer acessibilidade para todo mundo!”
Esclarecimento: Quando seguimos uma diretriz de acessibilidade, estamos atendendo simultaneamente a vários tipos de necessidades. Por exemplo, atender a três tipos de deficiências não significa trabalho triplicado.
Note-se que este mito está tão profundamente arraigado em nossa cultura, a ponto de aparecer expressamente no Decreto 5296, o qual estabelece, em seu Artigo 47, que “No prazo de até doze meses a contar da data de publicação deste Decreto, será obrigatória a acessibilidade nos portais e sítios eletrônicos da administração pública na rede mundial de computadores (internet), para o uso das pessoas portadoras de deficiência visual, garantindo-lhes o pleno acesso às informações disponíveis.”
Mito II – “Na prática, o número de usuários beneficiados com a acessibilidade é relativamente muito pequeno.”
Realidade: A maioria das pessoas que conhecemos não tem nenhuma deficiência e nunca esteve em nenhuma das situações especiais descritas acima. Mas isso não quer dizer rigorosamente nada a respeito da quantidade dessas pessoas e situações.
Por exemplo, quantos tailandeses você conhece que usam a internet? Será que você poderia concluir, então, que são muito poucos os tailandeses que usam a internet? Nossa visão da realidade é sempre distorcida, pois tendemos a nos aproximar e conhecer somente aquilo que nos é semelhante.
Temor oculto: “Esse negócio de acessibilidade é muito investimento para pouco retorno.”
Esclarecimento: Quando tornamos o nosso site acessível, além de atingirmos os usuários da internet que não nos podiam acessar devido às barreiras encontradas, também estamos criando condições para que novas pessoas se animem a usar a internet; ou seja, estamos ampliando o nosso mercado.
Além disso, estamos aumentando a visibilidade do site para os buscadores web, pois, assim como as pessoas cegas, eles também só conseguem ler o que está em texto.
Continue lendo a segunda parte desse artigo.
Veja: Acessibilidade web um dever cívico
Fonte: http://www.baguete.com.br/