Escaras: um pesadelo no cotidiano das pessoas com deficiência motora – Parte Final
Caro leitor, para que possa entender melhor esse estudo, sugiro que leia a primeira parte desse artigo.
O enfermeiro especialista Wiliam César Alves Machado, informa que : “Quanto ao uso de almofada de alpiste, embora a idéia possa parecer meio bizarra, funciona muito bem e proporciona conforto capaz de reduzir substancialmente a sensação de ardência na área de atrito, devido ao deslizamento de seus pequenos grãos com a casca cintilante de tanta celulose e a pequena capacidade de armazenar temperatura ambiente. Eu mesmo usei um bom tempo, vindo, mais tarde, substituir por uma de GEL que dava mais estabilidade e equilíbrio de tronco.
Já as almofadas de ar e/ou água, mesmo sendo alternativas para uso de curto prazo na prevenção de escaras, tendem a comprometer o equilíbrio do tronco e a estabilidade postural.
Dando continuidade ao assunto sobre escaras
As medidas preventivas de úlceras ou escaras de decúbito devem ser uma prioridade no processo de cuidado aos clientes com restrições na mobilidade, pois com a integridade da pele e mucosas diminuída, devido à falta de circulação sanguínea (oxigenação e nutrição), os fatores de risco aumentam substancialmente. (Assista o vídeo sobre os cuidados para evitar as escaras).
Atenção e observação especiais devem ser dirigidas à mobilidade e/ou capacidade de o indivíduo controlar seus movimentos, particularmente no que diz respeito às condições muito limitadas, ou seja, aquele que pode necessitar de ajuda para iniciar os movimentos como virar, levantar, puxar, equilibrar e/ou ficar na posição sentado, dado que contraturas do tipo espásticas podem requerer cuidados e técnicas específicos. Da mesma forma, quando a pessoa fica estática e/ou imóvel na cama, demonstrando incapacidade de mudar sozinha de posição, portanto, totalmente dependente de ajuda para as mudanças sistemáticas de decúbitos e, notadamente muito mais vulnerável a adquirir escaras. Nesses casos deve-se recorrer ao uso de colchão do tipo caixa de ovo, bastante conhecido no mercado, além de ser produto de custo razoável, se tomarmos como exemplo outras opções muito mais onerosas.
Nas mudanças de decúbitos deve-se observar o aspecto e a integridade da pele próxima das áreas com grandes proeminências ósseas, improvisando a colocação de travesseiros entre as pernas e outras medidas de conforto. São quatro as opções mais comuns para as mudanças de decúbitos, a saber: ventral (barriga para baixo); dorsal (barriga para cima); lateral direito e lateral esquerdo. O tempo ideal para se permanecer numa ou outra posição dependerá exclusivamente de o cliente apresentar queixa de desconforto, dor, mal-estar, para que seja mudado de posição. Via de regra, adota-se o esquema de mudanças de 4 em 4 horas, porém deve ser adequado a cada caso em suas singularidades. Ademais, recomenda-se evitar o lado que esteja com escara, por exemplo, se o cliente tem uma escara na região coxo-femural direita, não seria indicado permanecer em decúbito lateral direito.
Para reforçar as medidas preventivas é importante observar e avaliar a aceitação da dieta para traçar perfil nutricional, considerando que a pessoa bem nutrida tem menor possibilidade de desenvolver escaras. O mesmo se aplica aos aspectos de continência e higiene, posto que aqueles que apresentam incontinência urinária e fecal ficam mais expostos ao risco de desenvolver escaras, em face do teor ácido e corrosivo das fezes e urina acumulados por horas em contato com a pele íntegra.
Quando a pessoa permanece deitada ou sentada por longo período, o peso do corpo exerce pressão sobre as proeminências ósseas e, conseqüentemente a pele adquire coloração esbranquiçada decorrente da isquemia na área, tom que dá lugar ao avermelhado da hiperemia reativa, como resposta ao súbito aumento do fluxo de sangue na região antes comprimida. É importante esclarecer que a hiperemia reativa é uma resposta compensatória, eficaz e visível da vasodilatação localizada, somente se a pressão na pele for removida antes dela adquirir tom e aspecto cianosado, seguido de bolhas que se rompem facilmente e necrose”.
Curativos de escaras
Técnica
- O especialista em enfermagem Wiliam César Alves Machado* finaliza seu artigo, comentando a respeito do curativo de escaras. Veja o texto abaixo:Lavar as mãos em água corrente.
- Usar detergente anti-séptico e/ou sabão neutro.
- Calçar par ou mão de luva de procedimento (dependendo do aspecto da lesão).
- Usar éter ou benzina para remover o adesivo do curativo “velho”, tomando cuidado para soltar os pelos aderidos ao adesivo e observar reações alérgicas.
- Limpar a área ao redor da ferida com gaze embebida em soro fisiológico ou água fervida, fazendo movimentos no sentido de dentro para fora (descartar gaze após uso).
- ATENÇÃO: Nunca fazer movimento no sentido de fora para dentro da ferida, pois irá contaminar ainda mais e comprometer o processo de cicatrização.
- Fazer anti-sepsia da ferida com bolas de algodão embebidas em álcool iodado e/ou PVPI (POVIDINE tópico).
- Com outra gaze seca, remova com movimentos suaves os restos de tecido morto (necrosado) e as secreções (pus).
- Aplique quantidade do medicamento indicado, no caso de creme ou pomadas, procure encher a ferida até a metade (nós, particularmente, preferimos optar pela urinoterapia pelas suas inúmeras vantagens). Confira no artigo URINOTERAPIA e ESCARAS de nosso site.
- Cubra o ferimento com camadas de gaze e/ou gaze em compressa do tipo coxim, como medida de conforto e preventiva de possíveis atritos, fricções, etc.
- A fixação do curativo deve ser com adesivo antialérgico, pegando bem na borda da gaze em compressa para deixar o ferimento o mais arejado possível.
- Trocar o curativo sempre que necessário (na dependência da drenagem de secreção, após banho, incontinências, etc.) – avaliando cada caso em suas características especiais.
- Procurar deixar a pessoa bem acomodada e confortável, evitando posição que comprima a área da lesão.
- Fazer e/ou orientar sobre a importância das mudanças de decúbitos como medidas preventivas de complicações das escaras existentes, além do potencial para o surgimento de outras.
- Retire a luva e lave as mãos.
Avaliação
- Observar sistematicamente o aspecto externo do curativo quando das mudanças de decúbitos.
- Em face da presença excessiva de secreção purulenta e/ou sero-sanguinolenta, proceder à troca do curativo, independentemente de se estar com esquema de horário preestabelecido para as trocas.
- Atentar para o aspecto geral da ferida, em especial para o surgimento de uma espécie de camada de tom vermelho e aparência esponjosa em granulação, típicas de respostas favoráveis ao processo de cicatrização, evitando, portanto, tentar remover nos procedimentos de limpeza da área.
- Caso o procedimento esteja sendo feito em domicilio, solicitar orientação de um enfermeiro ou médico acerca da evolução do quadro.
Referência Bibliográfica
MACHADO, W. C. A. TEMO, ESPAÇO E MOVIMENTO: O ‘(d) eficiente” físico, a reabilitação e o desafio de sobreviver com o corpo partido. Rio de Janeiro, Papel Virtual, 2000.
* Sobre o autor: Especialista em Administração Hospitalar – PUC-RIO; Mestre em Enfermagem de Saúde Pública – EEAP – UNIRIO; Doutor em Enfermagem – EEAN – UFRJ; Professor Adjunto do Departamento de Enfermagem Fundamental da EEAP – UNIRIO; Professor da Faculdade de Enfermagem de Juiz de Fora – UNIPAC.