A ‘indústria’ da deficiência
Artigo de Andrei Bastos sobre a exploração das pessoas com deficiência por pessoas ou grupos políticos inescrupulosos.
Por Andrei Bastos
Assim como existe no Brasil, há muito tempo, a “indústria” da seca, também temos, há não tanto tempo, a igualmente criminosa “indústria” da deficiência. Assim como os “coronéis” da “indústria da seca”, beneficiários das gordas verbas governamentais para compensar a falta de chuvas e dos votos fidelizados com a distribuição de migalhas de tais verbas em currais eleitorais, hoje também temos um “coronelato” equivalente tirando proveito das pessoas com deficiência.
As duas principais ações patrocinadas pela “indústria” da deficiência são a insistente proposta de um Estatuto da Pessoa com Deficiência (eles não desistem nunca!) e a manobra contra a educação inclusiva com a inserção do termo “preferencialmente” na orientação para matrícula escolar de crianças com deficiência na Meta 4 do Plano Nacional de Educação (PNE).
Ora, se entre 1998 e 2010 aumentou de 13% para 69% o percentual de alunos com deficiência matriculados na rede de ensino regular, e, em sentido inverso, as matrículas em escolas especiais tiveram uma redução de 87% para 31%, em quê estão de olho os interessados na manutenção das escolas especiais separadas do ensino regular, senão nas verbas que deixarão de receber do governo e na preservação dos seus currais eleitorais mantidos na ignorância?
E quanto à proposta de Estatuto da Pessoa com Deficiência – que pelo simples fato de ser um instrumento de tutela excepcional ofende a dignidade humana da maioria das pessoas com deficiência, que têm na autonomia o principal elemento de elevação da autoestima e na Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência seu documento legal emancipador, não aceitando ser subjugadas ao poder dos “coronéis” consolidado num “Estatuto do Coitadinho” –, o melhor destino é, obrigatoriamente, o lixo da história. Ao contrário de crianças e idosos, que por suas condições específicas de dependência precisam de tutela excepcional, por que amputados, cegos, paraplégicos, paralisados cerebrais, surdos, tetraplégicos, autistas e demais deficientes intelectuais devem ser excluídos do exercício da cidadania plena? Em nome de um equivocado instrumento legal que é um fim em si mesmo e também alimenta a ignorância nos currais eleitorais?
As ideias que compõem a proposta de Estatuto e trabalham contra a educação inclusiva nascem e vivem nas sombras de interesses inconfessos, definhando e morrendo sob a luz da Convenção da ONU, e não podem vingar e promover o retrocesso até mesmo de um governo em que tal Convenção foi promulgada como emenda constitucional e que instituiu o Atendimento Educacional Especializado (AEE), o Plano Nacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência e o PNE.
“Educação é um direito inalienável e não se pode dispor dele”, repete como um mantra a advogada Claudia Grabois – e “o único texto constitucional referente à educação das pessoas com deficiência é o texto da Convenção da ONU, que é claro ao adotar a educação inclusiva”, sentencia a médica, professora, ativista por direitos iguais e cadeirante Izabel Maior. A elas eu me junto, quixotescamente investindo contra a poderosa “indústria” da deficiência.
Andrei Bastos é jornalista
Email:: andreibastos@andreibastos.com.br
URL:: http://www.andreibastos.com.br/blog
Veja:
Excelente matéria, é exatamente isso mesmo que acontece na atualidade, uma realidade nua e verdadeira…
Concordo que existe por parte de algumas entidades uma “indústria”, mas não se pode generalizar. O estatuto é para garantir direitos que deveriam estar assegurados com assinatura de acordos internacionais, mas que infelizmente não ocorrem. Quanto as matriculas nas escolas especiais não reduziram pq elas são responsáveis pelo atendimento especializado das crianças com deficiência matriculadas na rede pública de ensino, essa matrícula é computada no censo escolar. Outro ponto é que algumas escolas especiais tb iniciaram a inclusão recebendo crianças sem deficiência.
Excelente sua visão desse exploração política! Eu acrescentaria, entretanto as empresas que exploram o lado mais sensível, com seus lançamentos de ultima geração, onde os menos favorecidos se tornam eternos frustrados diante de produtos necessários para nos dar dignidade de vida.
Excelente matéria !
Quero complementar e denunciar os fabricantes de cadeiras de rodas que cobram preços
absurdos por produtos necessários a sobrevivência do cadeirante !
Dúvidas , estou a disposição com provas e notas fiscais de compra !
tioborges@rocketmail.com