Acessibilidade, Inclusão Social e Desenho Universal: Tudo a Ver
Caro leitor,
O texto abaixo foi extraído do site Bengala Legal e foi escrito pela socióloga Marta Gil. O site Bengal Legal está com um novo layout, visite!
“A acessibilidade é um direito, não um privilégio” (William Loughborough)
Cadeirante, à esquerda do desenho, olha perplexo para a palavra “NÃO”, que se ergue à sua frente como uma barreira enorme e ameaçadora.
Como definir “acessibilidade”?
O dicionário nos diz que “acessibilidade” é um substantivo que denota a qualidade de ser acessível; “acessível”, por sua vez, é um adjetivo que indica aquilo a que se pode chegar facilmente; que fica ao alcance. Na área da Deficiência, quando este termo começou a ser utilizado, estava restrito ao ambiente construído e designava a eliminação de barreiras arquitetônicas. Na verdade, a expressão mais freqüentemente usada era “eliminação de barreiras”, pois ficava subentendido que a pessoa se referia às barreiras arquitetônicas. A sensação que as pessoas tinham (tanto as pessoas com deficiência quanto familiares, amigos e profissionais) era muito negativa: a cidade era vista como um lugar perigoso, cheio de armadilhas e obstáculos a serem enfrentados, que requeriam disposição e paciência, todo dia. Nada era fácil, nada era possível. A ilustração de Ricardo Ferraz1 traduz brilhantemente a percepção e o sentimento dessa época.
1981: um ano a ser lembrado
Gradualmente, o panorama foi mudando. 1981 foi um marco significativo: a ONU – Organização das Nações Unidas decretou que esse era o Ano Internacional das Pessoas Portadoras de Deficiência (AIPPD). Parece que um farol se acendeu: a sociedade se deu conta que havia pessoas com deficiência e que eram muitas. A visibilidade recém adquirida, com respaldo da ONU, estimulou a mudança de atitudes: organizações DE pessoas com deficiência foram criadas; o tema foi matéria de jornais, televisões e rádios; direitos foram conquistados; as pessoas com deficiência puderam fazer soar sua voz e expressar desejos e vontades. Ou seja, começaram a sair da atitude de imobilismo e perplexidade que o cartum mostra.
No bojo desta mudança, que se processa de forma gradual e que até hoje está acontecendo, podemos destacar fatos e tendências. Um deles foi a substituição do termo “barreiras arquitetônicas” por “acessibilidade”, invertendo o sinal das lutas e dos olhares: não era “contra”, era “a favor”. Já havia passado o momento do antagonismo, do grupo das pessoas com deficiência contra a sociedade toda. Chegou o dia das pessoas com deficiência dizerem que queriam ficar junto com os outros e, melhor ainda, isso começa a se tornar realidade.
Mudança de olhar
Nessa inversão de sinal, o significado do termo “acessibilidade” foi ampliado. Percebemos que acessibilidade era mais do que construir rampas – embora rampas sejam, sempre, fundamentais. Mas representam, literalmente, apenas o primeiro passo. Rampas precisam levar a escolas, centros de saúde, teatros, cinemas, museus, shows de rock… Este novo sentido foi aplicado a outras esferas do fazer humano; passamos, então, a refletir sobre a acessibilidade (e o acesso a) na Educação, no Trabalho, Lazer, Cultura, Esportes, Informação e Internet.
Alcançar condições de acessibilidade significa conseguir a equiparação de oportunidades em todas as esferas da vida. Isso porque essas condições estão relacionadas ao AMBIENTE e não às características da PESSOA. Falar sobre alcançar condições de acessibilidade implica em falar de processo, que tem tempos e características diferentes em cada lugar, que tem idas, vindas, momentos que parecem de estagnação – mas, na verdade, são momentos em que novos conceitos, novas posturas e atitudes estão germinando. Processos são demorados e precisam do cuidado de todos.
Um cadeirante olha perplexo um pódio à sua frente, que tem lugares para os cinco primeiros colocados. Como os pódios tradicionais, ele é organizado em degraus.
A acessibilidade diminui a desvantagem
O ambiente pode piorar a forma de funcionamento de uma pessoa. Um restaurante com muitas mesas e pouco espaço de circulação entre elas exige que o garçom seja um malabarista, para equilibrar pratos e copos e que os clientes sejam ágeis e flexíveis, para chegar aos seus lugares. Se forem idosos, ou grávidas, ou obesos, ou simplesmente distraídos … a probabilidade de acidente é alta. O mesmo acontece com pessoas com deficiência: se o ambiente não oferece condições adequadas de acessibilidade, elas ficam em situação de desvantagem e sua condição de funcionamento (surdez, cegueira ou outra) se agrava ou até mesmo fica inviabilizada.
É importante perceber que, embora esses fatores ambientais não constituam barreiras para os que não têm deficiência, sua eliminação favorece a TODOS. Um ambiente acessível é bom para todos, não apenas para pessoas com determinadas características físicas, pois oferece qualidade de vida, segurança e permite a convivência e a interação entre diferentes.
Acessibilidade é um Direito Humano
Ao lutar pela acessibilidade, estamos defendendo um Direito Humano, que possibilita a equidade de oportunidades e que é condição sine qua non para que a inclusão social aconteça. Segundo Romeu Sassaki, “O paradigma da inclusão social consiste em tornarmos a sociedade toda um lugar viável para a convivência entre pessoas de todos os tipos e condições na realização de seus direitos, necessidades e potencialidades. Neste sentido, os adeptos e defensores da inclusão, chamados de inclusivistas, estão trabalhando para mudar a sociedade, a estrutura dos seus sistemas sociais comuns, as suas atitudes, os seus produtos e bens, as suas tecnologias etc. em todos os aspectos: educação, mostra.trabalho, saúde, lazer, mídia, cultura, esporte, transporte etc.”2
Para que a inclusão aconteça, a sociedade deve incorporar os requisitos de acessibilidade, pois o primeiro passo é freqüentar o mesmo espaço, com dignidade e tranqüilidade. Como saber mais sobre esses requisitos de acessibilidade? Quem os estabelece?
O cadeirante sobe uma rampa com inclinação adequada e cruza com uma pessoa sem deficiência, que usa a mesma rampa; ao fundo, outra pessoa desce escadas.
Desenho Universal
Os produtos, equipamentos, ambientes e meios de comunicação devem ser concebidos do ponto de vista do Desenho Universal, que recomenda que tudo (mas tudo mesmo) deve poder ser utilizado por todos, o maior tempo possível, sem necessidade de adaptação, beneficiando pessoas de todas as idades e capacidades. Está respondida a pergunta acima: é o Desenho Universal que estabelece os requisitos de acessibilidade. Vale a pena conhecer mais sobre esse conceito3, que tem como pressupostos:
- Equiparação nas possibilidades de uso;
- Flexibilidade no uso;
- Uso simples e intuitivo;
- Captação da informação;
- Tolerância para o erro;
- Dimensão e espaço para uso e interação.
- Quando o ambiente se torna acessível, pois adota os critérios e a filosofia do Desenho Universal, ele possibilita a Inclusão e, consequentemente, as pessoas com deficiência podem desfrutar de uma Vida Independente.
Veja a última parte desse artigo.
Veja: