Brasileiro supera revolta e disputa título de MMA para cadeirantes
“Quero lutar pra que as pessoas sintam vontade de me ver lutando de novo”, afirmou
A máxima de que o esporte é feito para socializar foi levada a sério pelo paulista Rafael Rodrigues após sofrer um grave acidente na adolescência. Mas agora, aos 34 anos, o momento é outro: competitividade, busca por vitórias e show para o público.
É assim que ele encara a disputa de um cinturão de MMA para cadeirantes, em um evento pioneiro desse tipo. “Quero lutar pra que as pessoas sintam vontade de me ver lutando de novo. Vou tentar dar show”, falou.
O atleta das artes marciais mistas tem uma bonita história de superação. Rafael sofreu um acidente aos 17 anos, quando trabalhava com seu pai em uma serralheria. Uma das paredes do estabelecimento caiu sobre seu corpo e o soterrou. Acabou quebrando a coluna e ficou paraplégico.
Usou o esporte na busca da socialização. Chegou a jogar basquete para cadeirantes e também praticou o ciclismo com bicicleta adaptada para deficientes. Mas foi a disciplina das artes marciais que o conquistou.
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Há quase três anos, foi convidado por um de seus preparadores físicos nos tempos do ciclismo para conhecer o jiu-jitsu. Ficou receoso no começo, mas após muita insistência decidiu tentar. Se apaixonou e virou um faixa azul. Tentou montar uma categoria para deficientes, mas não vingou. Ele venceu o único deficiente que também era praticante. Mas, depois, o rival decidiu abandonar a competição.
Rafael então passou a disputar combates contra atletas que não são deficientes, conseguindo até vitórias. “As pessoas na arquibancada se surpreendiam. Até meus adversários se surpreendiam. Quando chamavam pra pesagem, pra luta, as pessoas não conheciam o adversário. Aí eles viam um atleta encostando a cadeira de rodas e pensavam ´é com esse cara que vou lutar?´. É engraçado”, falou.
“O jiu-jitsu melhorou meu autocontrole, disciplina e alimentação. Tenho mais calma e evito ao máximo confronto com as pessoas, não discuto no trânsito, por exemplo. A arte marcial respeita o próximo e é uma questão bem educacional. Me considero um cara bem mais tranquilo”, continuou.
Enquanto fazia suas lutas no jiu-jitsu, praticava de maneira menos intensa o boxe. Até que viu na TV uma matéria sobre uma categoria de boxe para cadeirantes na Inglaterra. Foi atrás da organização do evento e descobriu que havia uma intenção dos dirigentes de criar a primeira competição de MMA para deficientes.
Enviou seu currículo, se empolgou e passou a treinar trocação com mais intensidade. Rafael foi bem avaliado pelos organizadores por seu histórico de lutas contra pessoas sem deficiência e contratado para já fazer a luta que valerá o cinturão da categoria até 70 kg do evento chamado “Wheeled Warriors” (Guerreiros sobre rodas, em português). Fez um contrato de cinco combates e disputa o título contra o francês Ludovic Marchand, no segundo semestre, ainda sem data definida.
É previsto na modalidade, que fará neste combate sua estreia, que os lutadores comecem nas cadeiras de rodas com a trocação por cima. É possível então que algum combatente tente colocar a luta para baixo jogando o oponente e sua cadeira para o chão. Depois disso, os árbitros interrompem o embate, e as cadeiras são retiradas. Os oponentes então ficam posicionados para uma luta de jiu-jitsu.
“Da mesma forma que pegam na perna e levantam o cara [no MMA], eu pego na cadeira e vou jogar o cara no chão. É isso que vou fazer. Caiu com a cadeira. Depois tiram as cadeiras e a luta se desenvolve pro chão. O juiz para a luta e continua na mesma posição”, explicou.
O oponente francês foi escolhido para decidir o título diretamente por seu bom histórico no boxe. Rafael já armou a tática para o combate e quer levar o rival para baixo, onde é mais forte, para usar seu jiu-jitsu e tentar a finalização.
“O que eu conheço dele é que é um cara forte, com mão pesada e tem boxe afiado. Estou trabalhando a trocação pra jogar de igual. Tenho jiu-jitsu mais apurado do que o dele, é bem forte. A estratégia é trocar o máximo que der e levar a luta pro chão.”
Contrário ao estilo “amarrão”, Rafael quer empolgar o público para que o esporte cresça. Quer dar show. “Vou trocar bastante, que é o que o públiuco gosta de ver. Vou fazer uma guerra. Não vai ser luta amarrada. Ele é forte e estou me preparando pra uma guerra na jaula. Garanto que essa luta será falada por muito tempo. Vitória não dá para garantir, mas garanto que vou dar meu máximo e tentar dar show.”
Reviravolta e sonho de viver só da luta – Rafael conta que nos primeiros dias após o acidente foi difícil de se aceitar como deficiente. Não tinha motivação para o processo de recuperação e ficou uma pessoa revoltada. “Quando eu cheguei na AACD, estava muito revoltado e não aceitava minha condição de cadeirante. Eu estava bem depressivo, bem mal mesmo. Fiquei de mal comigo”, lembra.
Até que um dia na AACD viu um deficiente tetraplégico e que não conseguia coçar o nariz por não ter movimento nos braços. A partir desse dia decidiu se motivar para a nova vida. “Ele mexia só o pescoço e pediu pra mãe coçar o nariz. Comecei a conversar com Deus e pedir perdão por ser revoltado e agradeci por ter aqueles dois braços”, lembra.
Apesar da bela história, prefere não se rotular como um exemplo de superação. “Sou como todo mundo, um cara que tem qualidades e também defeitos.”
Rafael é hoje casado e tem dois filhos. Formou-se em processamento de dados e trabalha em uma instituição financeira no ABC paulista. Mas seu sonho é conseguir viver exclusivamente das lutas.
Diz que não chega a colocar dinheiro do bolso para lutar por já ter patrocinadores, mas que o que tem de apoio ainda não é suficiente para viver só dos combates. “Meu objetivo é depois da luta do cinturão, trazer o título e correr atrás de patrocínio para quem sabe poder viver apenas da luta.”
Fonte: http://www.maispb.com.br/
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