AcessibilidadeDeficiência Física

Cadeirante enfrenta pelas ruas da cidade buracos, calçadas tomadas por veículos e falta de rampas

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A cadeirante Heloísa Frontin tenta conduzir sua cadeira de rodas na calçada quebrada: raiz da árvore levantou o concreto.
A cadeirante Heloísa Frontin tenta conduzir sua cadeira de rodas na calçada quebrada: raiz da árvore levantou o concreto.

INACESSIBILIDADE, ATÉ QUANDO?? (Nota do blog)

A publicitária Heloísa Frontin, de 65 anos, é uma senhora radical. Seu jeito de conduzir sua cadeira de rodas motorizada contrasta com a maneira calma com que pinta seus quadros em casa. Acompanhá-la num trajeto de Botafogo até o Catete é testemunhar uma aventura. Tendo ao lado o inseparável cãozinho Van Gogh, ela sai da calçada o tempo todo e ganha as ruas, espalhando surpresa e apreensão:

– As calçadas são impróprias a um cadeirante. E eu não quero deixar de ir aos lugares por causa disso. O jeito é enfrentar não só buracos e desníveis das calçadas, como bueiros e depressões do asfalto – diz Heloísa, bisneta do engenheiro Paulo de Frontin.

Os obstáculos a que se refere Heloísa atormentam também os pedestres. Ao sair do prédio onde mora, na Rua Dona Mariana, em Botafogo, ela mostra a raiz de uma árvore que levantou o concreto da calçada:

– Dá para passar por aqui? – indaga.

Não, não dá. Ela então vai pelo asfalto, rumo à Rua São Clemente. De repente, desvia-se de uma rampa malfeita, vai para a rua, depara-se com um bueiro e, em seguida, um buraco. Evita os dois obstáculos com talento de piloto de automobilismo. Na contramão…

Na chegada à estação Botafogo do metrô, Heloísa elogia o fato de o lugar contar com um elevador, mas a aprovação dura pouco. Para seguir rumo à Zona Norte, ela tem que atravessar por dentro de um trem, de modo a passar de uma plataforma à outra.

Hoje, das 35 estações do metrô, apenas seis (17%) contam com elevadores, mas, de acordo com a concessionária, até o fim do ano, eles estarão instalados em todas.

Dificuldades para embarcar em ônibus

Já no Largo do Machado, Heloísa parte para uma loja de conserto de cadeiras de rodas:

– Os funcionários vão dizer que cada vez mais cadeiras de rodas têm de ir para a oficina. Não dá para aguentar muito tempo tantos buracos e obstáculos nas calçadas.

Dito e feito. Todos na loja falaram sobre a má conservação das calçadas. Um funcionário diz que há buracos até em rampas para cadeirantes. Ao sair, Heloísa se dirige a uma rampa da Rua Dois de Dezembro, no Catete:

– Viu? Há rampas que não servem nem para nós – diz, desviando-se de uma.

Na volta para Botafogo, Heloísa prefere o ônibus. Passa o primeiro coletivo com elevador para cadeirantes. O trocador desce e informa que o equipamento não está funcionando. Em voz alta, convoca passageiros para levantarem, no braço, a cadeira de rodas de Heloísa, que recusa o improviso:

– Pode parar. De jeito nenhum!

No ônibus seguinte, Heloísa vê o elevador baixar, dispensa ajuda e faz tudo sozinha, com agilidade, num sistema em geral pouco amigável aos cadeirantes.

– Eu sei que sou corajosa, mas as coisas deveriam ser mais confortáveis para nós – critica Heloísa, que ressalta o fato de não ficar parada em casa, reclamando da falta de acessibilidade, numa cidade que vai sediar os Jogos Paraolímpicos de 2016.

De acordo com a Secretaria municipal de Transportes, todos os ônibus do Rio estarão acessíveis a cadeirantes até 2014. Atualmente, apenas um quarto da frota de 8.600 coletivos conta com esse recurso.

O secretário municipal de Conservação, Carlos Roberto Osório, reconhece que o Rio está longe do ideal quanto à acessibilidade nas calçadas. Ressalta, porém, que os Jogos Paraolímpicos de 2016 vão resultar não só em equipamentos esportivos amigáveis aos cadeirantes, como em calçadas totalmente reformadas no entorno deles:

– E todas as obras novas preveem acessibilidade aos deficientes físicos. Isso quer dizer que as calçadas de novas vias, como Transolímpica e Transoeste, terão um padrão adequado, tanto para o cadeirante como para o pedestre. Mas o passivo é grande.

Osório acrescenta que a prefeitura vem notificando e multando condomínios e casas que não cuidam de suas calçadas:

– Não é uma tarefa simples. A cidade ainda não tem a cultura de se responsabilizar pelas calçadas.

Ex-técnica de ginástica olímpica do Flamengo, Georgette Vidor, que há pouco mais de um mês assumiu a Secretaria municipal da Pessoa com Deficiência, diz que a cidade ainda têm incríveis carências em termos de acessibilidade:

– Em Londres, sede dos Jogos de 2012, está havendo um esforço muito grande para deixar as calçadas do entorno dos equipamentos esportivos acessíveis aos deficientes físicos. Todos os locais que terão eventos dos Jogos e seus entornos já estão acessíveis. Alguns lugares turísticos, também por causa do evento, já se tornaram acessíveis. Londres, na verdade, está investindo no turista com deficiência física. Não é favor, é uma visão de mercado – diz Georgette, que passou a usar cadeira de rodas após ter sofrido um acidente de ônibus com a equipe de ginástica olímpica do Flamengo, em 1997.

A superintendente do Instituto Brasileiro dos Direitos da Pessoa com Deficiência, Teresa Costa d’Amaral, afirma que as calçadas cariocas são impróprias não só para cadeirantes, como também para cegos, idosos, mulheres de salto alto e pessoas com muletas ou carrinhos de bebê:

– Com o projeto Rio Cidade, as calçadas passaram a ter rampas. Ocorre que, em muitos bairros do Rio, as ruas receberam novas camadas de asfalto e ficaram mais altas que as rampas, onde muitos cadeirantes já se acidentaram. Pelo jeito, é nesse cenário que o Rio vai receber os Jogos Paraolímpicos.

Vídeo: Uma heroína sobre rodas

Perigos incluem bueiros explodindo e fios baixos

Cadeirantes e pedestres enfrentam todo tipo de risco. É o ar-condicionado que pinga, o buraco no calçamento, a árvore que ameaça tombar, a fiação aérea pendurada quase à altura do chão, o reboco da marquise prestes a desabar e, agora, até bueiros que explodem a esmo. Caminhar pelas calçadas da cidade tem sido quase uma prova de obstáculos aos cariocas, mas com riscos à saúde. Basta percorrer ruas do Centro, da Zona Sul e da Tijuca para encontrar inúmeras armadilhas urbanas.

Uma delas, em plena Avenida Rio Branco, quase provocou, há dias, uma torção no empresário Carlos Nascimento. Ao se desviar de uma obra inacabada, quase na esquina com a Almirante Barroso, ele pisou em falso num buraco entre as pedras portuguesas:

– Fui me desviar dos tapumes e, por muito pouco, não levei um tombo. Fiquei com o tornozelo dolorido no dia seguinte.

Fonte: http://oglobo.globo.com/

Veja:

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Vera Garcia

Paulista, pedagoga e blogueira. Amputada do membro superior direito devido a um acidente na infância.

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