CCJ aprova proposta que dá mais autonomia para pessoas com deficiência
Uma pessoa com síndrome de Down, por exemplo, poderá se casar ou praticar outros atos da vida civil sem intermediação de curador
A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) aprovou, nesta quarta-feira (6), substitutivo ao PLS 757/2015, dos senadores Paulo Paim (PT-RS) e Antônio Carlos Valadares (PSB-SE), que defende mudanças na regulação da curatela pelo Código Civil, Código de Processo Civil e Estatuto da Pessoa com Deficiência. O substitutivo foi elaborado pela relatora, senadora Lídice da Mata (PSB-BA), e confirma, entre outras medidas, a tomada de decisão apoiada a pessoas com deficiência intelectual.
O texto foi aprovado com 19 votos favoráveis e nenhum contrário e ainda será submetido a turno suplementar de votação na própria CCJ. Segundo o Regimento Interno do Senado, toda vez que um projeto terminativo – aquele que dispensa ida ao Plenário – recebe substitutivo deve ser submetido a turno suplementar na comissão.
Resgate
O PLS 757/2015 pretende resgatar dispositivos sobre a curatela do Código Civil e do Código de Processo Civil derrubados pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência. A curatela consiste na nomeação judicial de um terceiro, o curador, para cuidar dos interesses de uma pessoa incapaz.
– O Estatuto havia mudado do Código Civil, retirando a autonomia de pessoas. Estamos corrigindo isso hoje. A curatela só será obrigatória em casos bastante peculiares, como no autismo grave. Uma pessoa com síndrome de Down, por exemplo, poderá se casar ou praticar outros atos da vida civil sem intermediação de curador. Muitas entidades e ministérios públicos estaduais apoiam o projeto – explicou o senador José Serra (PSDB-SP), na fase de discussão da proposta.
Pai de uma criança de sete anos com síndrome de Down, o senador Lindbergh Farias (PT-RJ) também defendeu a iniciativa, a qual, segundo ele, vai permitir mais independência às pessoas com deficiência.
– Tenho uma filha de sete anos, a Beatriz. A luta é pela autonomia, pelo emprego, pelo direito de decidir se quer casar ou não, se quer morar só ou não. O problema aqui é um conflito entre o Código Civil e o Estatuto. Estamos tratando a pessoa com deficiência como completamente incapaz. Isso é errado. O projeto fala em decisão apoiada em vez de decisão substitutiva. Muitos não têm noção do impacto disso. Além do impacto na vida civil, há a questão simbólica porque mostramos que as pessoas têm direito de decidir sobre suas vidas – afirmou.
Apoio
Um dos autores da iniciativa, o senador Antonio Carlos Valadares (PSB-SE), disse concordar com o substitutivo aprovado. Segundo ele, o texto dá à pessoa com deficiência o equilíbrio entre a autonomia e o direito ao auxilio para a prática de atos formais.
– As pessoas com deficiência maiores de 18 anos têm assegurado o direito da capacidade civil como qualquer brasileiro. Restaria apenas estabelecer salvaguardas aos que eventualmente precisarem de ajuda. O substitutivo está de acordo com a Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência – afirmou.
A relatora Lídice da Mata disse que buscou um texto que pudesse atender a todos ou pelo menos a média. Ela acredita ser plenamente possível conciliar o direito à capacidade com o apoio necessário, sem retrocessos em relação às novas normas sobre direitos e benefícios das pessoas com deficiência.
Decisão apoiada
Ao rejeitar a atribuição de qualquer viés de incapacidade às pessoas com deficiência ou sem condições de manifestar sua vontade (quem está em coma, por exemplo), Lídice partiu, em seu substitutivo, para o reconhecimento da plena condição das mesmas para exercer atos da vida civil. Assim, para quem tem deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave, mas é capaz de exprimir sua vontade, por qualquer meio, ficou garantida a formulação de pedido judicial de tomada de decisão apoiada para a prática desses atos de autonomia.
Esses cidadãos teriam que eleger como apoiadores pelo menos duas pessoas idôneas, com as quais mantenham vínculos – não necessariamente familiares – e em quem confiem. Nesse aspecto, o substitutivo faz três inovações importantes no Código Civil em relação ao texto aprovado pelo Estatuto: reconhece a validade e o efeito sobre terceiros de negócios e atos jurídicos não abrangidos pelo termo de tomada de decisão apoiada; torna obrigatória a contra-assinatura dos apoiadores nos atos cobertos por esse documento; e exige seu registro e sua averbação em cartório.
Curatela
Ao mesmo tempo que o substitutivo assegura às pessoas com deficiência mental, intelectual ou grave, maiores de 18 anos o direito ao exercício de sua capacidade civil em igualdade de condições com as demais pessoas, ele nega o recurso à tomada de decisão apoiada para aqueles que não consigam manifestar sua vontade por qualquer meio.
Quem estiver inserido nessa classificação, portanto, terá de recorrer à curatela para ter seus interesses civis resguardados. Nesse instituto jurídico, dá-se ao curador o poder de representação legal das pessoas sem condições de expressar sua vontade. Os atos praticados pelo curador, nessa circunstância, deverão ter como parâmetro a potencial vontade da pessoa representada.
Fonte: Agência Senado