ComportamentoDestaques

“Ele não é especial. Ele é meu irmão!”

Compartilhe:
Pin Share

“Ele não é especial. Ele é meu irmão!”A matéria abaixo foi extraída do site Inclusive.

Por Catia Malaquias

Eu não vou fazer rodeios. Cada vez que ouço a frase “necessidades especiais”, eu tremo.

Pra falar a verdade, eu não costumo chamar a atenção das pessoas sobre que termos usar, a menos que considere a linguagem ofensiva. Mas isso me tira do sério. E eu acho que está na hora dessa frase prejudicial e a mentalidade que a acompanha ir para o lixo.

A expressão “necessidades especiais” é comumente usada como um eufemismo para se referir a uma pessoa com deficiência (particularmente deficiência intelectual ou cognitiva e, frequentemente, uma criança) ou que funcione de alguma forma atípica.

Mas se você parar pra pensar, o adjetivo “especial” tornou-se um código para descrever lugares reservados para pessoas com deficiência. Por exemplo, “escolas especiais”, “centro de educação especial”, “oficinas especiais”, “casas especiais”, etc. Existem centenas de sites e páginas do Facebook dedicadas a pessoas com “necessidades especiais” e os pais de crianças “especiais” ou com “necessidades especiais”. A expressão “necessidades especiais” é usada regularmente pelos meios de comunicação – é a linguagem comum.

Embora a diversidade humana, o modelo social da deficiência e a inclusão, enquanto conceitos estruturantes dos direitos humanos, estejam se solidificando, para grande parte da sociedade a “história especial” ainda é assim:

Uma criança com “necessidades especiais” pega o “ônibus especial”, para receber “ajuda especial”, em uma “escola especial”, de “professores de educação especial”, para prepará-los para um futuro “especial”, vivendo em uma “casa especial” e trabalhando em uma “oficina especial”.

Isso soa “especial” para você?

Nas mentes de muitos em nossa sociedade um rótulo de “necessidades especiais” é efetivamente um bilhete só de ida para um caminho separado, segregado, de uma trajetória marginal pela vida.

A palavra “especial” é usada para maquiar a segregação e a exclusão social – e a continuidade de seu uso em nossa língua, nos sistemas de educação, na mídia etc serve para manter esses conceitos “especiais”, cada vez mais antiquados, que revestem o caminho para uma vida de exclusão e de baixas expectativas.

A lógica da conexão entre “necessidades especiais” e “lugares [segregados] especiais” é muito forte – ela não precisa de reforço – precisa ser quebrada.

Além disso, o rótulo de “necessidades especiais” reflete o modelo médico de “cuidado” com a pessoa com deficiência no lugar do modelo social de inclusão da pessoa com deficiência. Ele restringe e medicaliza a resposta da sociedade ao sugerir que o foco deve ser “tratar” as “necessidades especiais” da pessoa, em vez de agir no ambiente onde ela está, de modo a acolhê-la e incluí-la enquanto indivíduo.

Há outra consequência insidiosa, mas grave ao ser rotulado “especial” ou com “necessidades especiais”. O rótulo traz consigo a implicação de que uma pessoa com “necessidades especiais” só pode ter as suas necessidades satisfeitas por ajuda “especial” ou por pessoas “especialmente treinadas” – por “especialistas”. Essa implicação é particularmente poderosa e prejudicial em nossos sistema de ensino regular. É uma barreira que impede que administradores e professores de escolas regulares se sintam responsáveis, habilitados ou qualificados para abraçar e praticar a educação inclusiva em salas de aula regulares e, consequentemente, perpetua a atitude de resistência para a realização do direito humano à educação inclusiva nos termos do artigo 24 da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e da Lei Brasileira de Inclusão.

Em outras palavras, a linguagem das “necessidades especiais” serve como uma desculpa e legitima a atitude padrão de muitos educadores gerais de “não dá pra fazer”. Ela efetivamente priva a educação inclusiva do oxigênio necessário a uma cultura favorável de sala de aula de “poder fazer”.

Além disso, e mais importante ainda, o conceito de “necessidades especiais” não faz sentido. “Necessidades especiais” não existem. Uma criança com deficiência tem as mesmas necessidades como todos os outros – as mesmas necessidades humanas – de ser amada, alimentada, educada, abrigada – de se mover, comunicar, participar, pertencer etc. Uma pessoa pode precisar de mais assistência para uma determinada coisa quando seu ambiente foi predeterminado sem levar em conta sua deficiência, para satisfazer as necessidades humanas básicas.

O rótulo de “necessidades especiais” é inconsistente com o reconhecimento da deficiência como parte da diversidade humana. Nesse marco social, nenhum de nós é “especial” como todos nós somos irmãos iguais na família diversa da humanidade.

Lembro-me de uma canção de 1969 do grupo “The Hollies”, em que, em tom surpreso, uma jovem respondia a um estranho que sugeria que seu irmão mais novo era muito “pesado” para ela carregar. Eu acho que as irmãs do meu filho Julius ficariam tão surpresas – ou mesmo indignadas – se ouvissem o irmão ser chamado de “especial”. Diriam: “ele não é especial, ele é meu irmão”.

Tradução Patricia Almeida

Fonte: http://www.startingwithjulius.org.au/he-aint-special-hes-my-brother-time-to-ditch-the-phrase-special-needs/

Compartilhe:
Pin Share

Vera Garcia

Paulista, pedagoga e blogueira. Amputada do membro superior direito devido a um acidente na infância.

Um comentário sobre ““Ele não é especial. Ele é meu irmão!”

  • Olha, eu acho q não precisa ficar incomodada com um termo… respondendo algumas questoes, sim uma pessoa deficiente tem necessidades diferenciadas sim… o q chamamos de necessidades especiais… dize q ele é especial ai tudo bem nao acho q seja, mas ter necessidades q diferem das outras pessoas isso é vero…

    PS: Sou casada com um portador de necessidades especiais e lidamos muito bem com esse termo.

    Resposta

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

error: Content is protected !!

Damos valor à sua privacidade

Nós e os nossos parceiros armazenamos ou acedemos a informações dos dispositivos, tais como cookies, e processamos dados pessoais, tais como identificadores exclusivos e informações padrão enviadas pelos dispositivos, para as finalidades descritas abaixo. Poderá clicar para consentir o processamento por nossa parte e pela parte dos nossos parceiros para tais finalidades. Em alternativa, poderá clicar para recusar o consentimento, ou aceder a informações mais pormenorizadas e alterar as suas preferências antes de dar consentimento. As suas preferências serão aplicadas apenas a este website.

Cookies estritamente necessários

Estes cookies são necessários para que o website funcione e não podem ser desligados nos nossos sistemas. Normalmente, eles só são configurados em resposta a ações levadas a cabo por si e que correspondem a uma solicitação de serviços, tais como definir as suas preferências de privacidade, iniciar sessão ou preencher formulários. Pode configurar o seu navegador para bloquear ou alertá-lo(a) sobre esses cookies, mas algumas partes do website não funcionarão. Estes cookies não armazenam qualquer informação pessoal identificável.

Cookies de desempenho

Estes cookies permitem-nos contar visitas e fontes de tráfego, para que possamos medir e melhorar o desempenho do nosso website. Eles ajudam-nos a saber quais são as páginas mais e menos populares e a ver como os visitantes se movimentam pelo website. Todas as informações recolhidas por estes cookies são agregadas e, por conseguinte, anónimas. Se não permitir estes cookies, não saberemos quando visitou o nosso site.

Cookies de funcionalidade

Estes cookies permitem que o site forneça uma funcionalidade e personalização melhoradas. Podem ser estabelecidos por nós ou por fornecedores externos cujos serviços adicionámos às nossas páginas. Se não permitir estes cookies algumas destas funcionalidades, ou mesmo todas, podem não atuar corretamente.

Cookies de publicidade

Estes cookies podem ser estabelecidos através do nosso site pelos nossos parceiros de publicidade. Podem ser usados por essas empresas para construir um perfil sobre os seus interesses e mostrar-lhe anúncios relevantes em outros websites. Eles não armazenam diretamente informações pessoais, mas são baseados na identificação exclusiva do seu navegador e dispositivo de internet. Se não permitir estes cookies, terá menos publicidade direcionada.

Visite as nossas páginas de Políticas de privacidade e Termos e condições.

Importante: Este site faz uso de cookies para melhorar a sua experiência de navegação e recomendar conteúdo de seu interesse. Ao utilizar nosso site, você concorda com tal monitoramento.