‘Muitos me diziam para eu desistir’, diz cadeirante aprovada em medicina
Ana Paula de Souza Domingos decidiu tentar a faculdade, após conhecer médico com a mesma deficiência. Segundo a instituição, a estudante contará com todo o apoio necessário para garantir a permanência na graduação.
Ana Paula de Souza Domingos, de 19 anos, é natural de Visconde do Rio Branco e tem deficiência física motora dos membros inferiores, devido a um quadro de paralisia cerebral. Ela foi aprovada no curso de medicina da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) pelo Programa de Ingresso Seletivo Misto em 2021 e deverá iniciar o curso em 2022.
Segundo a estudante, o caminho até a aprovação foi marcado por muito esforço, já que os pais não tinham condições de pagar um curso para ela, que sempre estudou na rede pública.
“Como não tinha condições de pagar um cursinho, comecei a estudar em casa, com livros que eu já tinha, que eram bem poucos. Às vezes, eu achava alguns no lixo e aproveitava o que dava. Minha amiga Fernanda, que teve a oportunidade de fazer cursinho também me ajudou muito. Ela me passava algumas coisas e foi uma das únicas pessoas que, de fato, me ajudaram”, recordou a estudante.
Ao g1, Ana Paula contou ainda que quase desistiu de fazer o Pism no primeiro ano porque não tinha condições de ir para Juiz de Fora fazer a prova.
“Estudar foi algo muito difícil pra mim. Muitas escolas não me aceitavam porque tinham medo de eu atrasar os outros alunos, mas a minha mãe sempre correu atrás e conseguiu fazer minha matrícula em uma escola aqui de Visconde do Rio Branco. Quando eu fui fazer o Pism, eu quase não consegui ir, mas a Prefeitura disponibilizou um carro pra mim e os próximos anos de prova foram mais tranquilos quanto ao transporte”.
De acordo com Ana Paula, o sonho de se tornar médica sempre esteve presente na vida dela.
“Eu faço tratamento em um hospital de Belo Horizonte e sempre convivi com muitos médicos e pensei que talvez isso daria para mim, só que nunca havia visto um médico com alguma deficiência”, explicou.
Até que um dia, o sonho foi impulsionado. Ana Paula viu um profissional cadeirante no estacionamento do hospital. Segundo ela, inicialmente pensou que fosse um paciente, mas depois descobriu que ele era médico.
“Achava que, pelo fato de ser cadeirante, me formar médica era algo muito distante da minha realidade, até conhecê-lo. Infelizmente não tive a chance de me consultar com ele, mas ali eu tive certeza que eu também poderia tentar”, completou.
estudante contou ainda que não medirá esforços para ser uma profissional exemplar e uma referência para pacientes que, assim como ela, possam ser desestimulados quanto ao próprio potencial.
“Muitos me diziam para eu desistir de fazer medicina porque era muito concorrido e só passava quem fizesse cursinho. Falavam pra eu tentar um curso mais leve, mas eu persisti e consegui alcançar meu objetivo. O meu maior sonho é me formar e me tornar uma grande médica, para ajudar aqueles que precisam”, afirmou a estudante.
Aprovação
A estudante foi aprovada pelo Programa de Ingresso Seletivo Misto, da Universidade Federal de Juiz de Fora e iniciará o curso em 2022.
“Estudar Medicina em uma universidade pública significa muito para minha família e meus pais estão muito orgulhosos. Quando vi meu nome na lista de aprovados, foi um momento muito gratificante”, afirmou.
Ana Paula disse ainda que pretende se mudar para Juiz de Fora no início do ano que vem e que, por enquanto, está em conversa com a UFJF para saber quais auxílios poderá receber.
“Um alojamento estudantil acredito que ficaria complicado para mim, porque eu iria precisar da ajuda da minha mãe para algumas atividades. Estamos pensando na possibilidade de alugar um apartamento em Juiz de Fora, ou eu morar com alguém”, explicou.
Conforme a instituição, a aprovação de Ana Paula é simbólica e de grande importância para garantir o acesso à educação e a permanência no ensino superior para esse grupo. “Ela [Ana Paula] conta com apoio tanto institucional, quanto da comunidade acadêmica para cursar a faculdade com a assistência necessária”, citou em nota.
Apoio
A UFJF conta com o Núcleo de Apoio à Inclusão (NAI) que, desde 2018, elabora e implementa políticas de ações para pessoas com deficiência, Transtorno do Espectro Autista (TEA), Altas Habilidades e Superdotação nos cursos de graduação e pós-graduação da instituição.
O núcleo também desenvolve políticas e práticas de apoio à acessibilidade e à inclusão de técnicos e professores portadores de deficiência.
Atualmente, o NAI atende cerca de 60 estudantes e é formado por monitores e bolsistas de treinamento profissional, que realizam o acompanhamento acadêmico dos alunos com necessidades especiais e, indiretamente, auxiliam discentes que solicitam apoios pontuais, como transcrição de avaliações e trabalhos, adaptação de materiais pedagógicos e auxílio com recursos de tecnologias assistivas, como computadores adaptados, por exemplo.
“Entramos em contato com a Ana Paula assim que soubemos de sua aprovação para o curso de Medicina. Através de e-mails e contato telefônico, estamos orientando a estudante em relação ao ingresso na UFJF, as possibilidades de apoio que ela pode solicitar, tanto para se manter financeiramente em Juiz de Fora, quanto aos apoios acadêmicos que ela pode solicitar ao NAI. No Núcleo, estamos atentos para que o acolhimento à Ana Paula, assim como a todos e todas as estudantes com deficiência, seja realizado da melhor maneira possível”, afirmou a coordenadora do NAI, a professora Katiuscia Antunes.
Os estudantes surdos contam, ainda, com o apoio dos intérpretes e tradutores de Libras nas atividades obrigatórias de seus cursos de graduação. Os interessados podem buscar apoio do NAI entrando em contato por e-mail ou por meio de cada coordenação de curso.
Quanto às questões financeiras que impactam a permanência dos estudantes na UFJF, Ana Paula e outros estudantes podem contar com o programa de Bolsas e Auxílios da Pró-reitoria de Assistência Estudantil (Proae).
A Pró-reitoria é o espaço dedicado à formulação, implantação, gestão e acompanhamento das políticas de assistência estudantil, compreendida como o enfrentamento de demandas socioeconômicas dos discentes, para que a democratização do acesso ao ensino superior seja acompanhada de efetivas possibilidades de permanência dos alunos.
Além disso, a Proae atua no enfrentamento de demandas psicopedagógicas, com o objetivo de que o universo crescente de estudantes possa se sentir acolhido e reconhecido em sua diversidade e singularidades.
Fonte: G1
Parabéns. Vc deixa todos os brasileiros orgulhosos
Esperançosa em ler e saber de programas que universidades criam para os alunos com deficiência. Quanto mais a Educação compreender que sua posição para a construção de um mundo mais inclusivo vai além de matrículas, além de alfabetização, o caminho vai ficando mais curto e menos doloroso. Assim, sim! Parabéns, Ana Paula! Sucesso!