''O surdo deve ser educado no idioma materno e por meio dele'', diz psicólogo
ENTREVISTA
Fernando Capovilla, PSICÓLOGO
Responsável pelo maior estudo já feito no mundo sobre o desenvolvimento de cognição e linguagem de estudantes surdos, com 9.200 avaliados, Fernando Capovilla é enfático: “Não se rouba a língua de uma criança.”
O levantamento faz parte do Programa Nacional de Avaliação do Surdo (Pandes), em curso desde 1995.
Recebeu financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep). Confira a entrevista abaixo.
Quem foi avaliado?
Avaliamos surdos e deficientes auditivos, estudantes em escolas especiais bilíngues e em escolas comuns sob inclusão. Alunos surdos são aqueles cuja língua materna é a Língua Brasileira de Sinais (Libras) e adquirem o português como segunda língua. Deficientes auditivos são aqueles cuja língua materna é o português.
Qual foi a metodologia?
Os alunos surdos foram avaliados numa bateria de mais de 25 instrumentos psicométricos e neuropsicológicos, durante cerca de 20 horas. Avaliamos funções e competências como leitura alfabética e orofacial de palavras em português, compreensão de leitura de textos, qualidade ortográfica da escrita, compreensão de sinais da Libras, etc. Além disso, também adaptamos provas nacionais de habilidades, como a Provinha Brasil e a Prova Brasil.
Quais os resultados?
Descobrimos que as crianças surdas se tornam capazes de fazer leitura orofacial apenas à medida em que se tornam capazes de fazer leitura alfabética. Também adquirem capacidade de fazer leitura alfabética e de compreender textos mais cedo e melhor em escolas especiais bilíngues do que em escolas comuns. A proficiência em Libras aumenta a proficiência em português (leitura e escrita alfabéticas) que, por sua vez, aumenta a probabilidade de desenvolvimento da habilidade de leitura orofacial. Crianças surdas privadas de ensino-aprendizagem em Libras na educação infantil e no ensino fundamental aprendem a ler e escrever mais tardiamente e menos proficientemente, e têm mais dificuldade em fazer leitura orofacial.
Logo, como deve ser a educação do surdo?
A educação do surdo deve se dar em seu idioma materno e por meio dele. Por isso, a criança surda deve ter acesso a uma comunidade escolar linguística sinalizadora desde a educação infantil até pelo menos meados do ensino fundamental. Tendo educação em Libras no turno principal, a criança deve aprender conteúdo escolar em Libras e a partir dela aprender sistematicamente a língua portuguesa. Finalmente, deve fazer uso do português (leitura e escrita alfabéticas proficientes, leitura orofacial proficiente) para aprender conteúdo escolar em nível cada vez mais profundo e em escopo cada vez mais amplo e compreensivo.
E como fica a inclusão?
A inclusão em escola comum com apoio no contraturno é muito boa para crianças com deficiência auditiva. Para os surdos, o melhor arranjo é ensino-aprendizagem em escola bilíngue até pelo menos o 5.º ano do ensino fundamental.
Há prejuízos, além dos educacionais, para um aluno surdo “incluído” em uma classe convencional?
A linguagem talvez seja a característica mais essencialmente humana, dentre todas aquelas de que dispomos. E ela se desenvolve naturalmente quando somos expostos a uma comunidade linguística cuja modalidade de comunicação é adequada à nossa. Se a modalidade da língua se adequa à modalidade que a criança tem intacta, o desenvolvimento da linguagem se dá de modo natural. Isso é de importância crucial, já que a linguagem é o principal veículo de consciência, aprendizagem, memória, pensamento e expressão. Privação de desenvolvimento de linguagem é uma das maiores tragédias a que se pode condenar um ser humano.
QUEM É
Professor do Instituto de Psicologia da USP, é doutor em Psicologia Experimental e livre-docente em Neuropsicologia. Atua na Avaliação de Desenvolvimento e Distúrbios de Cognição e Linguagem com Intervenção Preventiva e Remediativa.
Fonte: Estadão (27/06/11)
Veja:
Comecei fazendo Libras na feneis,mas pararam o curso e agora gostaria de continuar estou no intermediário,anseio muito ser intérprete,onde eu posso me especializar mesmo aqui no RIO DE JANEIRO, moradora do bairro de bangu, realmente tenho muito interesse, anseio muito ter contacto com surdos, tenho encontrado dificuldades também,alguém pode me enviar alguma orientação,agradeço.