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PcD na academia: o problema não é meu corpo, é a atitude dos outros

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Tenho uma deficiência física, sou amputada do braço direito. Como PcD na academia, eu sei bem o quanto esse ambiente pode ser desafiador. E assim como qualquer pessoa, só quero cuidar da saúde, mexer o corpo e me sentir bem. Mas ir pra academia, no meu caso, não é só pegar peso. O mais difícil nem são os equipamentos, mas sim encarar os olhares tortos e o descaso de quem parece achar que a gente não devia estar ali.

Desde o primeiro dia, percebi que muita gente ainda acha estranho ver uma pessoa com deficiência treinando. Tem gente que olha com pena, outros com curiosidade, outros com aquele julgamento silencioso. Como se eu não tivesse lugar ali. Mas o pior mesmo é a postura de muitos instrutores. Não me importo com olhares curiosos, porque há muito tempo aceitei minha deficiência. O que realmente me incomoda é a falta de boa vontade dos instrutores.

Fui em várias academias e já cansei de encontrar profissionais que não perguntam nada, não se interessam. Passam aqueles treinos prontos, como se fosse tudo igual pra todo mundo. E não é. Cada corpo tem uma história, uma necessidade. O meu, por exemplo, exige adaptação, mas posso e quero treinar. O problema é que falta vontade de ajudar. Custa os instrutores perguntarem: “Quer ajuda? Precisa de algo?” Isso já mudaria tudo. Do público que frequenta a academia, infelizmente, até dá pra esperar esse tipo de reação. Mas dos profissionais que estão ali justamente pra orientar? É decepcionante.

Recentemente, encontrei uma unidade da Smart Fit em Paulínia onde fui bem acolhida, e isso foi uma surpresa boa. Mas, sinceramente? A maioria dos instrutores continua agindo como se estivesse lá só pra quem já tem o corpo “padrão”. Se você não tem barriga trincada ou um bumbum avantajado (especialmente se for mulher), dificilmente recebe atenção. Parece piada, mas é real. E é vergonhoso.

Quando há acolhimento, tudo muda

Por outro lado, faço pilates e lá tudo é diferente. Me sinto acolhida, respeitada e incluída. As profissionais me escutam, adaptam os exercícios, explicam tudo com paciência. Sinto que sou tratada como alguém que importa, com individualidade. É um ambiente onde a inclusão realmente acontece. Já na Rede Smart Fit, mesmo com a boa experiência pontual em Paulínia, no geral, não me sinto assim. Falta esse cuidado, essa empatia, essa escuta. E isso faz toda a diferença.

E não sou só eu que sinto isso. Cadeirantes, por exemplo, sofrem ainda mais. É até raro encontrar algum cadeirante na academia. Claro, tem a questão do próprio receio da pessoa com deficiência de frequentar um ambiente despreparado, cheio de olhares e poucas adaptações. Mas também, quando aparecem, encontram um cenário nada acolhedor: máquinas que não têm acessibilidade, espaços apertados, nenhuma adaptação pensada. E quando precisam de ajuda, são ignorados. A estrutura não convida, os profissionais não incentivam. Como esperar inclusão se tudo ao redor afasta?

Inclusão: o que ainda falta

É necessário criar ambientes que considerem as necessidades específicas de cada pessoa. Imagine um lugar onde os programas de exercícios são adaptados para diferentes tipos de habilidades, onde os equipamentos são projetados para todos e onde cada pessoa se sente segura e confortável para se exercitar. Isso não é um sonho distante, é uma necessidade urgente. Academias que realmente se preocupam com inclusão precisam investir em estrutura, formação de equipe e principalmente, em empatia. Porque inclusão de verdade começa com o respeito ao outro e com o entendimento de que todos têm o direito de cuidar do próprio corpo.

Enfim, a academia precisa estar preparada na acessibilidade arquitetônica e atitudinal. Ou seja, não basta ter rampas e banheiros adaptados se a atitude dos profissionais continua excludente. A acessibilidade também está no modo como os instrutores se relacionam com os alunos, no interesse genuíno em ajudar, em entender e acolher. É essa combinação que transforma a experiência e faz qualquer pessoa se sentir parte do espaço.

Isso tudo em uma rede que se vende como moderna, inclusiva e acessível. Incluir não é só deixar entrar. É ouvir, é acolher, é se importar. É dar suporte de verdade. Quem mais precisa de ajuda na academia é justamente quem tem limitações, e não quem já sabe o que está fazendo. Enquanto isso não mudar, muita gente vai continuar se sentindo excluída de um espaço que deveria ser pra todos. Agora até entendo porque é difícil encontrar PcD na academia. A realidade de ser uma PcD na academia ainda está longe de ser acolhedora. A falta de estrutura, de empatia e de preparo cria barreiras muito maiores do que qualquer limitação física. E isso não tem nada de fitness. Tem de injustiça mesmo.

E você? Já passou por alguma situação parecida em academia? Como foi a sua experiência? Me conta nos comentários. Vamos conversar sobre isso e levar essa discussão adiante. Quem sabe, juntos, a gente não consegue provocar uma mudança real nos espaços que deveriam acolher todo mundo?

Por Vera Garcia

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Vera Garcia

Paulista, pedagoga e blogueira. Amputada do membro superior direito devido a um acidente na infância.

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