Pessoas com deficiência: concursos públicos e cotas – Parte 3
Caro leitor,
Dando continuidade ao artigo “Pessoas com deficiência: concursos públicos e cotas” da Drª Adriana Pagaime, chefe do Departamento de execução de Projetos da Fundação Carlos Chagas, veja hoje, a terceira parte desse interessante estudo.
INCLUSÃO COMO AÇÃO AFIRMATIVA NO BRASIL
Este trabalho não abordará a inclusão no sentido de discutir como a escola tem atuado em relação a “receber o aluno na escola” e não discutirá também as questões em torno do ambiente escolar (sala regular ou classe especial, por exemplo), ou mesmo as questões que tangem à formação de professores, temas que merecem discussões e pesquisas aprofundadas. Todavia, nesta pesquisa, teremos como norte o conceito e o sentido da inclusão escolar como integrantes do processo de preparação básica do aluno para o mercado de trabalho.
Tendo em vista que, entre todas as atividades, o trabalho é que está diretamente ligado à dignidade humana, por propiciar recursos necessários à subsistência, à realização pessoal e até a aceitação no meio social, abordaremos a inclusão como uma das formas de aproximar a relação escola/educação na perspectiva de que a escola deve assumir sua responsabilidade ao receber o aluno e prepará-lo para a vida em sociedade.
De acordo com Bueno (2008), dentre as políticas educacionais no mundo, a inclusão pode ser considerada o tema mais candente; basta acompanhar as políticas internacionais, os discursos políticos, as ações do governo e de muitas escolas. Enfim, segundo o autor, a inclusão escolar, que deve conduzir à inclusão no trabalho e na sociedade, está “na ordem do dia” e surge como a “nova missão da escola”.
Nessa mesma perspectiva, Patto (2008) chama a atenção para o uso epidêmico da palavra “inclusão”, principalmente em um momento em que o capitalismo “exclui um enorme contingente da população economicamente ativa e produz excedente de mão de obra, avançando em estereótipos e preconceitos”, quais sejam: cor da pele, nível de escolaridade ou pessoa com deficiência.
Num momento de dispensa em massa do trabalho, fala-se o tempo todo em incluir. Resta saber em que termo. Este é o cerne da questão. Para respondê-la é preciso entender o processo de exclusão sob o modo capitalista de produção ontem e hoje. (Patto, 2008, p.26)
No VII Seminário de Cegos, Batista (2007), em sua explanação sobre os direitos universais de igualdade e análise sobre educação e trabalho, definiu que o trabalho para o capital se resume em “transformar um ato criativo em potencialidades”, e queo ensino “adestra” para dar conta da tecnicidade do trabalho. Daí a diferença entre a divisão técnica e a divisão social do trabalho. Afirmou, ainda, que, para o capital, a pessoa com deficiência é significada como “força não produtiva”, ou “produtiva em menor escala”, que não interessa ao capital. Logo, sua inserção no mercado de trabalho é dificultada, tendo ressaltado a responsabilidade da escola em incluir o aluno e prepará-lo para esta sociedade.
No que tange às perspectivas políticas da inclusão escolar, Bueno contesta o otimismo que apresenta a educação inclusiva como meta para a construção de uma sociedade inclusiva. Para o autor, uma educação verdadeiramente inclusiva não será alcançada numa sociedade excludente. Nessa ordem, está implícito que a sociedade jamais incorporará a todos, e terá, assim, que ser permanentemente inclusiva, o que vai de encontro à construção de uma sociedade democrática, que gradativamente incorporasse a “massa de deserdados produzidos por políticas injustas e de privilegiamento das elites sociais” (Bueno, 2008 p.57).
Se a inclusão não é, de fato, responsabilidade exclusiva da escola, e as perspectivas para o futuro apontam para uma sociedade excludente, sempre haverá a quem incluir na escola, e, do mesmo modo, na sociedade, pois a inclusão social se dá por meio do trabalho, e este também não será para todos (Bueno, 2008). De acordo com o autor, suas críticas não são no sentido de apontar as impossibilidades de se construir ou se investir em políticas de inclusão, mas de contribuir para que a história possa tomar um rumo diferente, para que o futuro seja no mínimo melhor que o presente.
À luz de tais considerações e para responder as inquietações que originaram esta pesquisa, faremos as análises, possíveis, dos resultados obtidos pelos candidatos inscritos e amparados pela lei de reserva de vagas às pessoas com deficiência.
PROCEDIMENTOS DE PESQUISA
Este trabalho teve como fonte de coleta de dados uma instituição responsável pela organização e aplicação de concursos públicos, configurada como privilegiada pela experiência em aplicação de provas em todo território nacional. Após autorização da superintendência da instituição para utilização dos dados estatísticos dos concursos por ela realizados, iniciou-se o processo de coleta de material. Definimos analisar os dados referentes a 2005, 2006 e 2007, coletados junto ao setor de documentação da instituição, observadas as publicações na Imprensa Oficial dos Editais de Divulgação dos Resultados (Diário Oficial do Município, Estado ou da União), bem como a lista dos aprovados no referido acervo.
Procedeu-se o levantamento do número total de inscritos em todos os concursos de 2005, 2006 e 2007, cujos editais previam a reserva de vagas para pessoas com deficiência. Caracterizamos a demanda de inscrições (com e sem deficiência) por gênero e por faixa etária. Foram analisados comparativamente os desempenhos (classificação) dos candidatos aprovados, com e sem deficiência, por meio das listas de resultados.
Fonte: Est. Aval. Educ., São Paulo, v. 21, n. 45, p. 127-144, jan./abr. 2010
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