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Tetraplégico, ex-goleiro do São Paulo encontra rumo na vela

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Após acidente com duas vítimas fatais, Bruno já colhe frutos como velejador

Até que ponto um acidente de carro, a perda de amigos e da promissora carreira pode colocar fim ao sonho de um jovem de 20 anos?


No caso de Bruno Landgraf das Neves, a resposta é simples: não pode. O sonho não acabou, passou por adaptações. Antes, a meta era a medalha olímpica no futebol nos Jogos de Pequim, em 2008. Agora, não mais na grama, e sim na água, o triunfo paraolímpico em Londres, em 2012, norteia os caminhos do ex-goleiro. Do mais novo velejador.

Bruno era considerado o melhor entre os diversos candidatos a suceder Rogério Ceni no gol do São Paulo até agosto de 2006. Um grave acidente automobilístico matou o colega de posição e clube Weverson e a amiga Natália Lane, jogadora de vôlei. Bruno, o motorista, passou oito meses e 12 dias internado.

Depois de quatro anos, a clausura das paredes do quarto se transformou na indescritível sensação de liberdade. Desde 2009, o rapaz de 24 anos veleja duas vezes por semana no clube da Associação dos Servidores do Banco Central (ASBAC), localizado na represa de Guarapiranga, Região Metropolitana de São Paulo.

Acompanhado do pai, Luiz, Bruno procurou o ASBAC e a primeira vez deu aos integrantes do clube a quase certeza de que não haveria outra. O dia estava feio, a chuva batia contra seu corpo e a ausência de movimento de tronco tornava necessária a presença de alguém que servisse como suporte no barco adaptado.

O ex-goleiro não se assustou. A rigorosa preparação física (veja na próxima página) deu a Bruno condição para superar as dificuldades e se tornar aposta da equipe para o Mundial Paraolímpico de 2011, que valerá uma vaga nos Jogos de Londres-12.

– No início, ele não aguentava mais de cinco minutos com o leme, perdia a mão com um vento mais forte. Hoje ele faz regatas de duas horas sozinho. Seu nível técnico surpreende a todos – elogiou Vitor Hugo, técnico angolano há 11 anos no Brasil.

Bruno precisa da ajuda de equipe e pai quando sai da cadeira de rodas para o barco. Lá dentro, é o capitão. O timoneiro. É ele quem decide os rumos do novo veículo de trabalho.

– Aqui tenho mais liberdade. Os treinos, de goleiro e vela, são muito puxados. Mas, mesmo competindo, é uma relação com a natureza.
É notável a alegria do rapaz, de 24 anos. Os sorrisos com os amigos, o contato com os barcos e as brincadeiras com amputados e cadeirantes. Brincadeiras?

– A gente pede para o outro ir correndo pegar alguma coisa (risos). Quem vê pensa que somos maldosos, mas as pessoas têm receio de falar, perguntar. Assim levamos a vida melhor. Estamos no mesmo barco.

A expressão de paz de Bruno ao velejar não indica os obstáculos superados nos últimos anos. E nem os que ainda serão superados. Mas indica que o jovem não precisa de medalhas para se considerar vencedor.

Bate-Bola com Bruno – Velejador paraolímpico


‘Não estou treinando apenas para ter ocupação. Quero competir e ganhar’

LANCENET!: Como tem sido adaptar o sonho de atleta da grama para a água?
Bruno: Eu me imaginava indo para a Olimpíada de 2008 no futebol. Com a Seleção que foi, percebi que tinha chances. Os dois goleiros foram o Renan e o Diego Alves, que disputaram o Mundial Sub-20 comigo (leia mais abaixo). Agora é preciso começar a imaginar um objetivo para focar nele.

L!: É importante ter sempre um objetivo em sua recuperação?
Bruno: É importante. Se não tiver, vou treinar para nada? Só para passar o tempo, ter ocupação? Estou aqui para disputar, quero ganhar. Tem o Mundial, as regatas no clube em que já ganhei medalha…

L!: Quantas já conquistou?

Bruno: Ganhamos (Bruno e a proeira Elaine) três medalhas: duas de bronze e uma de prata. Em uma das regatas o Vitor (técnico) estava junto, pois eu ainda não conseguia pilotar o barco sozinho.

L!: Você passou a encarar o acidente e sua recuperação de forma diferente após voltar a competir?

Bruno: Como tudo que acontece na vida, você tira coisas boas e ruins. Eu tive muitas perdas com o acidente, o Weverson e a Natália são como irmãos para mim. Mas eles estão sempre nas minhas orações e tenho procurado viver, fazer as minhas coisas da melhor maneira possível. Se antes eu tentava dar meu melhor no futebol, agora tento fazer o mesmo na vela.

L!: Qual a importância do esporte na sua recuperação?
Bruno: A pessoa que sofreu algum acidente tem de procurar um esporte, conhecer mais gente, ver outros casos, lutar para melhorar a cada dia. Indo aos hospitais, vendo outros casos. Se você acorda falando que está ruim, piora. Vejo gente com mais dificuldades, sem tanto apoio, crianças pequenas. Vejo que estou muito bem e conversar, ajudar, apoiar. Para nós, apoio vale mais do que qualquer dinheiro.

L!: No esporte, seu objetivo é a medalha. E na recuperação?
Bruno: Estou focado na vela, mas quero voltar a andar, nem que seja com andador. Pode demorar ou não, isso não me preocupa, senão deixo de fazer minhas coisas direito. Quando consigo ganhos normais, como a contração de um músculo, para mim é uma grande vitória.

L!: Que tipo de movimento já lhe deu essa sensação de vitória?
Bruno: Quando consegui mexer um pouco o braço no hospital foi uma grande vitória, e depois com a fisioterapia em casa, movimentos como comer sozinho, segurar um suco, não depender de ninguém para isso. São coisas pequenas para outras pessoas. Para mim não.

L!: O que é mais fácil? Jogar futebol e ter de defender, ou velejar?
Bruno: Jogar futebol. É mais fácil enfrentar alguém que chuta bem do que ver onde está o vento. Em ambos você tem de tomar decisões, mas no futebol ainda pode haver tempo de consertar. Aqui, qualquer erro os barcos já te passam. Temos de ser mais precisos.

Fonte: LANCE
Referência: http://www.universotricolor.com/

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Vera Garcia

Paulista, pedagoga e blogueira. Amputada do membro superior direito devido a um acidente na infância.

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